quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Lidando com as perdas da vida - parte II


A vida do ser humano já tem inicio com uma grande perda. O bebê é lançado para fora do conforto do útero de sua mãe, a partir daí sua maior necessidade passa a ser os cuidados maternos. Não é nada fácil ter de se tornar alguém separado da mãe, aprender a defender-se sozinho e sentir dentro de si que não faz parte do mesmo ser, como antes. Essa é a primeira perda de uma pessoa, e apesar de haver ganhos ao viver a separação física e emocional da mãe,  quando se é muito pequeno e despreparado,  as conseqüências de uma separação prolongada podem ser muito graves. O bebê sente-se seguro diante da presença materna, e seu primeiro terror é o medo de perdê-la.
Quando a criança completa aproximadamente seis meses de vida já é capaz de criar uma imagem mental referente a ausência da mãe. Ele é capaz de se lembrar de sua mãe, sendo assim sua ausência provoca grande sofrimento, sente-se desamparado e rejeitado. Os bebês sentem que a mãe não irá retornar, e quanto mais jovem o bebê, mais sofrimento causará essa sensação. Ter alguém próximo, que possa substituir os cuidados maternos, ajuda a amenizar esse sofrimento, porém, somente a partir dos três anos de idade a criança poderá começar a entender que a ausência da mãe é temporária, e mesmo assim, uma espera por seu retorno pode parecer interminável para a criança.
Uma criança, que é deixada por sua mãe pode se manifestar de maneira muito negativa em relação ao abandono sentido. Esse bebê foi submetido ao grande desespero de ter sido abandonado, mesmo que tenha sido por algumas horas apenas. As respostas podem incluir protesto, desespero e alheamento. Algumas crianças, que não conseguem suportar a ausência, tendem a procurar substitutos maternos, e quando há o retorno da mãe, a criança tende a recebê-la de maneira fria, distante e apática. Essa é uma das maneiras encontradas para enfrentar sua perda. É um disfarce para seu sentimento de raiva, uma defesa contra o medo de amar e perder novamente.
Os primeiros laços do ser humano são muito importantes, através deles é possível tornar-se humanos completos, o elo (mãe-filho ou pai-filho) ensina a amar e a ser amado. Se existirem separações graves no inicio da vida de um bebê, este será marcado por cicatrizes emocionais no cérebro, devido ao prejuízo a uma conexão humana essencial. Todo indivíduo necessita obter uma conexão humana. As pessoas são programadas para amar desde seu nascimento, e essa capacidade surge assim que é possível identificar um ser separado do “eu”.
Para que um bebê tenha um desenvolvimento saudável, é fundamental que possa ser submetido a uma conexão especifica nos primeiros meses de vida. A privação, temporária ou definitiva da presença da mãe tem um preço alto. O sofrimento do bebê é muito intenso, e existem danos, mesmo nas situações familiares mais comuns, como um divórcio, hospitalização, ou qualquer distanciamento físico ou emocional com a mãe.
Nas situações atuais, com a evolução do movimento feminista, onde a maioria das mães tem de trabalhar, são os filhos que sofrem as conseqüências. As crianças estão sendo privadas do direito de criar laços de confiança, alegria e auto-avaliação, os quais ocorrem nos primeiros anos de vida através da conexão com os pais. Com a ausência destes, os indivíduos crescem entendendo que o amor é um capricho e que os laços humanos podem se tornar investimentos perigosos, devendo então reservar o amor para si próprios, como forma de sobrevivência.
A criança  privada de uma ligação primaria, tende a se tornar menos confiante, seguro e não consegue adquirir a convicção de que vão encontrar, no decorrer da vida, pessoas capazes de satisfazerem suas necessidades. Quando, mesmo existindo essas ligações, se elas forem defeituosas ou instáveis, a tendência será transferir algumas das frustrações e necessidades não satisfeitas, para relacionamentos futuros, como amigos, filhos, cônjuges e até para colegas de trabalho.
A maior responsabilidade dos pais, quando decidem cuidar de seus filhos, é fazer com que aprendam a “ser humanos”. Para isso é necessário estar por perto, amparando, protegendo e ajudando para que um dia possam lidar com as perdas naturais da vida. Cada  perda tem seu tempo certo para acontecer, e depende dos pais perceberem qual a hora de estar perto e qual a hora de afrouxar os laços que construíram do decorrer da vida, até que os filhos estejam preparados para seguir os seu caminho. 
Janaina N. Soares
Texto inspirado no livro: "Perdas necessárias".

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