terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Lidando com as perdas da vida


O ser humano lida todo o tempo com o proibido ou impossível e busca sempre uma forma de se adaptar aos seus relacionamentos e vivê-los de formas imperfeitas e distintas. Nesses relacionamentos fatalmente inclui-se a perda, o abandono e a desistência. A perda faz parte da vida humana. Apesar disso, é muito difícil aceitá-la e conviver com ela. 
A melhor forma de superar uma perda é lamentar por ela. A lamentação pode ser um processo interior difícil, lento e doloroso em qualquer situação, tanto para o fim de um casamento, o fim de uma amizade especial, a perda do que fomos ou do que um dia esperamos ser, porque todos esses fatos fazem parte da essência humana, e o homem não está pronto para viver sem isso. 
A dor da perda é vivida em fases. Através destas fases se torna possível compreender a dor como um processo e não como um estado permanente. A primeira fase desse processo vem acompanhada de um choque, apatia e a sensação de descrença. É difícil aceitar que, a pessoa amada não está mais por perto. Vive-se então um momento de espera, onde o intelecto tenta reconhecer a perda, enquanto o corpo tenta negar os fatos. Quando passa o choque inicial, as vezes permanece um sentimento de incredulidade e negação, até que seja possível aceitar a realidade.
A segunda fase é mais longa e pode causar grande sofrimento psíquico. É uma fase de choros e lamentações. Passa-se por mudanças de humor e possíveis queixas de desconforto físico. É uma fase que envolve letargia ou atividade exagerada, regressão à outras fases, ansiedade pela separação, raiva e um desespero muito intenso. Aqui, a raiva pode ser direcionada à pessoas que estão de alguma forma, envolvidas na perda. O sentimento de culpa, seja irracional ou justificado, também é quase sempre parte do processo de dor pela perda sofrida.
O processo de dor passou pelo choque inicial e pela fase de dor aguda, a partir daí inicia-se o que pode ser chamado de final do luto. É um fim que significa um grande passo para a recuperação, aceitação e adaptação. Nessa fase a pessoa começa a recuperar a estabilidade, a energia, a esperança, a capacidade para ter prazer e investir na vida. É uma adaptação à grande dificuldade de lidar com as novas circunstâncias da vida. A tendência é obter mudanças de comportamento e criação de novas expectativas e autodefinições, uma forma de se acostumar com a nova vida.
As fases descritas anteriormente consistem no processo de lamentação, a forma que o homem encontrou para conquistar o crescimento e superar a dor, tentando se adaptar a ausência da pessoa amada ou da relação constituída. Porém, as pessoas não estão acostumadas a conviver com a perda, e algumas não tem força o suficiente para superar, entrando em um processo prolongado ou crônico de dor, estagnando-se na segunda fase. O individuo vê-se preso a um estado de dor intensa e irremediável. Sente um grande sofrimento, raiva, culpa, ódio por si mesmo, depressão. Se torna incapaz de dar continuidade a sua vida.
O normal é que a dor passe em um determinado período, talvez um a dois anos. Após viver todas as fases, voluntariamente a pessoa vai se desligando do relacionamento que perdeu. Quando isso não acontece, pode-se dizer que o sofrimento se tornou patológico, ou seja, a pessoa não pode e não quer se libertar.
Pode acontecer o contrário também, quando o sofrimento, que deveria ser intenso, fica ausente. Essa também é uma forma patológica de sofrimento. Algumas pessoas evitam sua dor por anos ou até a vida toda, se enganam achando que suportam bem a dor da perda, porém, na realidade não podem lidar ou aceitar.
A realidade é que, a dor existe, faz parte da vida, e deve ser enfrentada. As perdas causam sofrimento, porém, são necessárias, afinal na maioria das vezes precisamos perder para se obter finalmente um ganho. Quando a perda envolve a morte de quem se ama, ai fica mais difícil, porque a morte é algo quase desconhecido propriamente, não se sabe lidar com ela de forma realista, e não se tem escolha quando o assunto é esse. Resta então o poder de escolher a atitude a ser tomada diante da morte ou da perda. As escolhas podem estar entre morrer quando alguém que amamos morre, viver como incapacitado diante da dor, ou buscar novas formas de adaptação.
O processo de lamento dá certo quando se escolhe buscar outros caminhos. Esse processo faz o homem capaz de reconhecer a sua dor, senti-la, passar por ela. Através do lamento, é possível libertar os mortos e guardá-los dentro de nós.  Lamentar ajuda na aceitação das dificuldades deixadas pela perda, e a partir desse lamento, é possível enfrentar e elaborar o luto e a dor de perder.

Janaina N. Soares
Texto inspirado no livro “Perdas necessárias”. 

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